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Sem retorno

Sem retorno

28/03/2012

Em meio à neblina característica do Oceano Pacífico que comumente paira sobre a Baía de San Francisco, erguem-se majestosamente as duas torres de sustentação da Golden Gate Bridge, certamente uma das pontes mais famosas do planeta. Cartão-postal americano, é considerada uma das maravilhas do mundo moderno e parada obrigatória para qualquer turista com uma câmera pendurada no pescoço, exatamente como este que vos fala.

Por mais que você tenha rumado ao norte da península de San Francisco unicamente com o objetivo de ver a ponte, é um choque ao avistá-la pela primeira vez. Mesmo estando nublado demais para que a imagem se assemelhasse àquelas repetitivamente retratadas nos filmes, é uma sensação interessante. Uma enorme e icônica estrutura que, para os habitantes locais, já faz parte do dia a dia, apenas uma ponte. Sim, um lugar de peregrinação dos abasbacados turistas, mas também um caminho para o trabalho e um ponto para praticar exercícios.

No entanto, desavisados como eu logo deixam o sorriso de lado ao se depararem com uma das características mais marcantes da Golden Gate Bridge. Em direção ao meio da ponte, pelo passeio compartilhado por ciclistas e pedestres, na primeira estrutura de concreto que serve de ancoragem para os cabos de sustentação, há uma placa com os dizeres "há esperança, faça a chamada". Abaixo do sinal, uma caixa metálica amarela, castigada pela maresia, abriga um interfone que, ao apertar de um botão, conecta a pessoa a um centro de aconselhamento a suicidas.

A Golden Gate Bridge, depois fui saber, é considerada o local com o maior índice de suicídios do mundo. Pessoas de diversos cantos do planeta – talvez motivadas pela representatividade da estrutura ou pela beleza natural dos arredores – colocam fim às próprias vidas em um mergulho de aproximadamente 75 metros de altura, o que resulta em um impacto a cerca de 120 km/h. É comum a polícia encontrar carros de aluguel abandonados nos estacionamentos ao redor da ponte. Em 2009, a contagem de mortes estava em cerca de 1.300, desde a inauguração em 1939. Hoje, com uma média de 30 suicídios por ano, a lista certamente está maior.

Há uma enorme discussão sobre instalar ou não estruturas para evitar os saltos. Mesmo com tantas incidências, não há uma tela para impedir o ato – o parapeito tem aproximadamente 1,5m de altura, e não oferece a menor resistência. Os opositores alegam falta de recursos, riscos à estrutura da ponte e até uma agressão estética à arquitetura do local. O governo, por sua vez, adotou medidas como a instalação dos interfones e câmeras de vigilância, patrulhas constantes e o fechamento da ponte para pedestres durante a noite (o trânsito de ciclistas ainda é permitido, no entanto).

A sensação que fica é a de que o Estado reconhece que não há obstáculos para impedir a pessoa motivada a acabar com a própria existência, e se restringe a um último apelo por meio de placas, que também informam que "as consequências de saltar podem ser trágicas e fatais". Meio que para tirar o seu da reta em possíveis processos judiciais e falar para os inconsoláveis familiares algo como "não digam que não avisei".

Um local magnífico. A força do vento, o cheiro do mar, a ilha de Alcatraz e a vista da cidade fazem do passeio uma experiência inesquecível. Mas, ao mesmo tempo em que há alegria ao estar em um dos locais mais belos do mundo, também há um peso no ambiente. Uma dicotomia extrema, da felicidade da vivência e da tristeza do fim. Principalmente ao pensar que muitos ali deram seus derradeiros passos, e tiveram aquela paisagem como pano de fundo para uma atitude de extremo desespero.

Apesar dos avisos explícitos, fiquei mais marcado por um subliminar, no entanto extremamente simbólico. Mais adiante, entre as sinalizações de trânsito para as seis movimentadas faixas na parte destinada ao tráfego, há uma placa de "No U-Turn", ou seja, "proibido retorno". Para alguns, ao tocar a estrutura da Golden Gate Bridge, é um caminho só de ida. Tanto para os motoristas que cruzam de San Francisco para Marin County (e vice-versa) como para aqueles que decidem usar as congelantes águas da Baía para atravessar para "o outro lado".