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Bonita, engajada e culta (mas tão sem graça)

Bonita, engajada e culta (mas tão sem graça)

06/02/2012

Disseram que ela era recatada, tradicional e de família, educada com costumes europeus. Ela acreditou, todos acreditaram, e o passado humilde ficou pra trás. No início, foi fácil esquecer a simplicidade e o estilo livre daquele povo para estufar o peito e se orgulhar do ar sofisticado, que todos a atribuíam.

Aos poucos, o charme virou sinônimo de frieza. Todos diziam que ela era tímida demais, arrogante até. E ela acreditou. Aceitou, resignada, que carregar aquele status tinha o preço amargo de afastar as pessoas. Passaram a implicar com o seu jeito de falar, com a cor da sua pele – de menina que não sai de casa para não se sujar, com o seu penteado e até com a sua falta de referências culturais.

Queria ser alguém de novo. Mas alguém que fosse aceita por todos, de forma sutil e simpática. Tentando relembrar suas raízes, esforçou-se para se mostrar engajada em uma causa. Natureza, que seja! Não virou hippie, para não chocar demais, mas achou que o amor às plantas e animais poderia tirar o estigma de menina mimada.

Deu certo. Elogios, gente que vinha pedir a opinião sobre o assunto, bastante bajulação. Muita, mesmo. E ela, como sempre, acreditou. O sentimento de aprovação lhe subiu a cabeça: queria mais. Não tinha esquecido as críticas sobre sua falta de bagagem cultural.

Revoltou-se. Precisava de uma nova personagem. Alguém disse que ela tinha um quê moderninho, algum potencial para as artes. É isso! Lá foi ela fazer a transformação – mas nada muito chocante. Museus, teatro e uma biblioteca aqui, outra ali.

Aprovada! Ela tinha o visual, a causa e a cabeça. Falaram que podia virar modelo. Adivinha se ela não acreditou?

Conseguiu seguir carreira por um tempo, mas começaram a perceber que faltava alguma coisa. Modelos devem ser versáteis. Conhecer novos povos, experimentar ritmos e gostos diferentes para poder mostrar aos outros, reles mortais, como aquilo que estão ajudando a divulgar é bom, enriquecedor, estranho, inovador ou ao menos... divertido. Disseram que ela não sabia se divertir.

Infelizmente acreditou e não soube – ou não quis mais – encontrar a tal diversão.

Agora, está faltando alguém pra falar: “Curitiba, minha filha, larga essas máscaras e vai viver.”

Vai que ela acredita.

 

http://www.youtube.com/watch?v=eBShN8qT4lk&feature=player_embedded

Sobre o ocorrido com a polícia no Largo da Ordem, durante o pré-Carnaval (matéria aqui).
Mais especificamente sobre algumas posições vistas em redes sociais, de gente que também acreditou que diversão, fora das baladas de elite, é “coisa de vagabundo”.