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Arte sequencial e literatura

Arte sequencial e literatura

21/04/2011

Algumas semanas atrás tomei conhecimento de uma pequena celeuma no mundo das letras brasileiras (“pequena celeuma” é pleonasmo óbvio. O mercado editorial brasileiro não é grande o suficiente para causar uma “grande celeuma”). O Prêmio Jabuti anunciou as novas categorias de “gastronomia” e “turismo e hotelaria”. Isso fez muita gente pensar: “Uai, porque não uma categoria de quadrinhos?”. Sobre isso, o Érico Assis, tradutor de quadrinhos pela Cia. Das Letras, escreveu aqui e aqui.

A alegação lugar-comum é a de que Arte Sequencial não é literatura e, por isso, não deveria ser uma categoria. Isso traz, claro, alguns problemas. A primeira e mais óbvia é a do despeito. Afinal, livros de gastronomia e turismo e hotelaria tampouco o são e, ainda assim, lá estão com suas categorias a partir do próximo ano.

Outro problema, menos óbvio, é o de não considerar um produto de Arte Sequencial como literatura de forma alguma. Recorro à uma definição cunhada por Leyla Perrone-Moisés, uma importante pesquisadora das letras brazucas: “literatura é quando o modo como se diz algo, gera suplementos de significado determinantes sobre o que se diz” (cito de cabeça, então não me crucifiquem). Ora, se é assim, podemos considerar os desenhos como, simplesmente, um recurso estético, como as repetições de Vonnegut, ou os múltiplos pontos de vista de Falkner, ou os devaneios de Cortázar.

Se não for assim, o outro problema é onde desenhar uma linha. O próprio Vonnegut citado gostava de rabiscar seus manuscritos e muitos desses rabiscos chegavam às edições finais. Porque os deseinhos do Vonnegut podem, mas os do Spiegelman não?

E, voltando ao Jabuti, diz aí, Cachalote é muito mais livro que Leite derramado, não?